martes, junio 19, 2007

Manu foi-se embora






E agora?! Quem vai rir quando eu bater a cabeça às 7h da manhã em um poste?
Quem vai pintar minhas unhas de vermelho no terraço?
Quem vai dividir comigo os pecados contidos numa casquinha de sorvete?
Como vou fazer quando quiser dançar feito uma louca no meio de uma festa bichogriloalternativa? Quem vai me acompanhar nesse mico? Quem???

Será impossível divertir-me sozinha ouvindo “Los 40 principales”...

E chegará sexta-feira e terei que caminhar até El Rinconcillo sozinha, sem ninguém para brincar de passarela comigo pela rua.

Quem vai ter ataques de riso quando o motorista de ônibus engrossar ou quando o garçom brigar comigo?
Quem vai me dar bons toques de moda e quem me informará das melhores liquidações da cidade?
Quem provará comigo todos os perfumes do Corte Inglés sob os olhares fulminantes das vendedoras?
Quem será minha irmã mais velha, preocupada, conselheira e amiga?
Quem? Quem? Quem?

Não quero fazer drama. Sei que volto logo (sorte que nos vemos logo!). Poderemos fazer tudo novamente Manu – apesar de nos reconhecerem aí!

Mas a verdade é que a habitación ao lado da minha já sente a tua falta! E eu também...

martes, junio 05, 2007

Raízes


A beleza dos quadros foi bondosa. Permitiu-nos até chegar perto, para certificarmos que ali estavam as pinceladas. Não intimidou. Convidou cada um dos visitantes a entrar no universo da paleta colorida. Era como o anfitrião nos dissesse: “Passem, conheçam minha vida, sintam-se a vontade, meu quarto é de vocês”. E assim entramos no quarto de Van Gogh, caminhamos por seus campos, acompanhamos o jantar de seus plantadores de batata (até onde a chama da única vela agüentou).

Já no final da exposição, Tree Roots, com os azuis e amarelos que só ele sabe como usar, nos propós pensar em o que, realmente, nos liga a terra, nos faz forte e nos protege: raízes fortes, nada mais. “As if they were grimly and passionately rooted into the earth and yet half torn loose by the storms. I wished […] the black, testy roots with their knots to express something of the battle for life”.

Fácil entender sua relação com o irmão Theo, sua única morada e porto seguro.

Ao final das linhas nos foi possível descobrir o que achava ele da vida e do mundo. Sua mente perturbada (ou seria a nossa, de não ter entendido antes sua lógica), de forma incrível, formulou raciocínios tão simples e coerentes que até hoje desconcertam quem traduz sua linguagem. Não é lero-lero pseudoartístico. É só uma dose de Van Gogh: a esperança, perseverança, amor, ambição e realização que buscamos descobrir nos matizes de cada dia. E que, no fundo de sua loucura, ele encontrou.
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O fim da tarde era de um laranja quase ofuscante (saberia Van Gogh reproduzi-lo?!). O caminho florido deixava evidente a primavera e a estrada de mais de 1300 km chegava ao fim. Passamos por tanta gente, tanta cidade, tanta história que me resulta difícil organizar um raciocínio (por simplista e reducionista que seja):

Frankfurt, a chegada, os abraços e beijos, a saudade acumulada que, num despejo de emoção, desaparece. Inicio de viagem, vontade de gritar: mundo apresente-se!!!!

Cidades sem nome ao longo do caminho tiveram papel de coadjuvantes dignas de Oscar.

Colônia, com suas cervejarias e seu goulash – incrível! A catedral é – arrisco ser simplória – mais que grandiosa. É imponente.

Amsterdã nos recebeu da maneira mais incomum que poderíamos imaginar: quase de atropelo, literalmente! Linda, original, caótica.

Brugges é o sonho na Terra, o conto de fadas que idealizamos de pequenos. A história doce e crua que só deixa a desejar o cavaleiro e a princesa.

Paris é Paris. E Paris é quase tudo! É arte, é história, é arquitetura. Seus cidadãos podem gabar-se do que possuem – e o fazem!!!

Madrid representa laços e passados que adoramos recordar! Passamos lindamente, ao lado da família que tanto hechamos de menos y tanto amamos.

A Toledo de Don Quixote é fantástica, de pedra, uma fortaleza que permanece parada no tempo guardando espadas e segredos entre as ladeiras.

Mas, voltando ao carro e ao final de tarde que nos saudava, me dei conta que, poderia ter mudado o nome de todas as cidades pelas quais havíamos passado; poderia reduzi-las a uma se uma condição se mantivesse: a companhia da minha família. Estava chegando a Sevilla depois de oito dias de sonho, oito dias de surpresas e experiência, e me sentia plenamente feliz. Van Gogh sabe do que falo. Quando se tem raízes fortes e pode compartilhar com elas o caminho, todos os destinos te levarão de volta para casa.



*Vivendo um conto de fadas com a família que eu tanto amo. Brugges – Bélgica.